TAMBORES D`ÀFRICA

Tambores d`África (Autoria: Sônia Moura)   tambores.jpg

A madrugada enluarada descansava à beira do lago, enquanto o calor de um continente, atravessado quase ao meio pela linha do equador, refrescava-se à luz do luar e o vento acariciava as folhas da vegetação local. Pois foi nesta hora, entre o sono e sonho que ouvi, pela primeira vez os tambores d`África a chamarem por mim.
Vi meus antepassados chamando-me a participar da roda dos tambores.
Certamente eu conhecia aquele lugar e, ali, sentia-me à vontade, estava em casa e corria solta por um espaço de alegria, descalça, levantando a poeira com meus pés de menina ainda livre. Tudo era uma festa.
Saudávamos alguns orixás ou seria somente uma reunião para que a lua se sentisse feliz, talvez cantássemos para ela.
O cheiro da madrugada provocava em mim um torpor, eu me sentia leve e parecia flutuar ao som dos tambores que marcavam o compasso daquela terra e daquela gente, da minha gente. Como eu estava feliz!
Com os cabelos de algodão, uma negra acolheu-me em seus braços e incentivou-me a acompanhar com os pés o ritmo, que se espalhava pela savana e fazia dançar quem o escutasse.
De repente, colocaram-me no meio da roda e eu dancei toda a minha juventude, todo o meu presente, nem me importei com o passado ou com o futuro, o meu tempo era aquele, ali eu estava viva e com os olhos dos meus a pousarem em mim, com uma ternura que eu jamais havia experimentado.
Senti-me acolhida e muito amada, sentia-me parte da terra e das águas africanas.
A súbita presença de meus antepassados veio banhar meu corpo, com uma infusão feita com folhas sagradas para o meu povo de origem, enquanto o toque dos tambores consagrava aquele momento.
Os tambores d`África chamavam-me a viajar em meio a minhas raízes, aquelas que me foram sonegadas, raízes que se perderam no meio de tristes histórias.
Qual o nome africano de meus antepassados? De que lugar da África eles foram caçados? Eu não sabia nada, não havia registro, não havia nomes, só havia sombras e sofrimentos.
A partir daquela madrugada, meu corpo e minha alma ficaram para sempre marcados pelos rastros do passado e eu jamais deixei de ouvir o som dos tambores d`África.

(Do livro: Sùbitas Presenças de Sônia Moura)

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