PEDRA RARA

               –

As passagens do tempo são metáforas… Ele disse:

– O novo ano não há de tardar

E uma cadeia com elos de esperança

Está a se formar

Quantos divinos encantos se esconderão

Nos elos desta corrente,

Que todas as gentes se põem a desejar?

– As passagens do tempo são metáforas… Ela disse:

-Faz parte da arte do tempo

Ele, que segura o estandarte,

A todos conduzir para a profundeza

De uma enigmática caverna

Onde moram famintas ilusões,

Mentindo aos borbotões 

Onde há um tempo que teima em nos dizer

Que é eterno…

– As passagens do tempo são metáforas… Eles disseram

-Tempo menino vadio, que corre macio sem se preocupar

Porque ele sabe que não vai mais voltar

Sua presença é pedra rara, tão fugaz como qualquer ilusão

Como um mago nos pega pela mão e encanta

Abelha que suga o mel e depois procura outra flor

E, sem nenhum pudor, amputa certezas,

acalma as brabezas e coroa levezas

Depois, todo faceiro, exibe sua nobreza com altivez

Fingindo nos dar a lucidez ao que é impossível controlar

Por causa do seu flutuar, escreve uma ficção,

Afaga o real, sustenta a alma e a ilusão

Desdobrando-se em sete mil cores

Desce aos mares, retoma os ares,

E sai a saracotear em círculos rumo ao infinito

ACALANTO

Sossega teu sonho em meu regaço

Que ainda há tempo para amar

Entenda:

O amor não é nó, é laço

– É tarde, dizes assim

Meio sonolento,

Peito cheio de dor,

Alma ao relento…

Espera…

Deixa nascer em ti

Um novo momento

Acorda teu dia

Enrosca tua esperança

E teu cansaço

Em minha alma ardente

Esquece o mundo lá fora

Ele mente

O amor e os amantes

Não são apenas almas carentes

Volta a sonhar

Pendura teu desânimo

Nas asas do vento

Deixa renascer tua alma

Vem para meus braços

Aninhe-se em mim

O mundo é voraz

Mas a vida pede palmas

Ama, nada mais terno

Para revigorar a esperança

Vive que viver em amor

Não cansa 

(por Sônia Moura)

Da boca pra fora

Que ninguém venha me falar de amor

Não, por favor, por favor,

Falem de guerra, falem de paz,

Mas de amor não me falem jamais

Falem de grana, falem de fama,

Mas nunca mais me falem de amor

Essa farsa não mais me engana

 

Vocês dizem que amar é a solução

Qual!

Isso é mentira

O amor só serve

Para nos deixar na mão

Por favor,

Afastem de mim essa tentação

 

Palavras tão vãs

Tão patranhas

Nascidas de um coração

Angustiado

Espalhando mentiras

Por todos os lados

Não acreditem nelas, não!

 

 

NOVO REBENTO

Coisa de velho e de novo

É chocado como um ovo

Um certo dia desponta…

Para uns pode ser oco

E para outros será eco

Nascerá em qualquer lugar

E em todo lugar estará

Em casa, na rua, na bolsa,

Na gaveta, na estante

Ou guardado no computador

O que importa é o seu valor

Necessário a qualquer povo

Quando ele chega ao mundo

Comemora-se mais um Ano – Novo

Em que mãos irá cair?

Que corações irá tocar?

Com ele quem sorrirá?

Com ele quem chorará?

Isso ninguém saberá

Se pode afirmar, porém que

Quando a semente foi lançada

Um novo broto germinou

Na mente de um jogo inovador

E em algum solo brotou

Em meio a muitas palavras

Completando o que estava deserto

E, com certeza, alguém estará por perto

Para amparar o rebento

-Viva! Um poema foi gerado

– 

 

AINDA

Ainda consigo ver-te por uma fresta da saudade,

ainda consigo lembrar-te em festa,

e o sabor do teu beijo, sinto, ainda.

A saudade do teu abraço, arde ainda,

             e é por estas e outras,

que eu sempre me pergunto:

– Por que eu não te esqueci de todo, ainda?

 

POR UM TRIZ

Por um triz,

se encontra alguém para amar e ser amado,

ou se perde alguém que tanto amamos, pois

só o destino resolve quem será o eleito e o desejado

Por um triz,

perde-se o avião ou o bonde da história

e o que seria alegria ou glória

passa a ser tristeza ou melancolia

O quem sabe será uma baita alegria?

Por um triz,

o rumo da vida vai de fio a pavio,

O amor aparece, ou não aparece ou, então, desaparece

deixando você a gritar na proa de um navio

o quanto a vida é boa

ou levará você a caminhar pelo fio da navalha,

a gritar que sem amor, não há nada que valha

Por um triz,

a fera perde a presa que sai saltitante e ilesa,

enquanto a fera de estômago vazio

maldiz a natureza, com certeza

Por um triz,

Em uma festa, em uma rua ou em uma ilha

acontece um olhar furtivo,

O seu o corpo estremece, a face enrubesce

e tudo acontece em um piscar de olhos,

A vida se transforma

O amor tem pressa

Não o deixe escapar

Tudo está por um triz…

 

 

 

 

 

 

 

Manhãs

Nas manhãs cinzentas de um dia sem luz 

Vejo imagens lindas no céu apagado

Sinto a beleza do dia

Sinto as gotas findas do luar

Vejo sol timidamente surgir 

Então o mar vem docemente

Meus pés beijar

Esta na hora de a vida acordar

(por Sônia Moura)

VOZES

VOZES

(A primeira voz)

              I

Nasci para a vida ontem

Eu já nem sei mesmo quanto tempo faz

Caminho por estradas tortuosas

Por vias sinuosas

Mas tenho a certeza de que

Um dia eu chego lá

            II

A natureza me trata com carinho

A poesia me embala o canto

Da escrita roubo um doce beijo

Do canto dos pássaros sorvo a beleza

E vejo em cada flor um novo encanto

             III

Quem dera o doce bem-te-vi

Dissesse a mim onde tu estás

E uma fada surgisse em minha caminhada

Trouxesse a certeza de um novo encontro

E por uma lente de contato azul

Eu visse a tua face em um espelho

Que me falasse de ti…

  

(A segunda voz|)     

                   I

 

Acorda, menina, desta fantasia

Tens a tua frente a realidade luzidia

Janela aberta para todos os mistérios

Tirando-te desta embriaguez

De sonhares e desejares

O que não existe mais

                II

Não vês que teus sonhos

Fazem de teus delírios um chiste?

Acorda, o dia já desperta,

E a vida não deve tardar

Acorda, mude teus planos,

Aceita, pois é hora de recomeçar

 

              III

Tu tens um mundo

A esperar por ti

Cuidado que ele pode se cansar

Mas ainda é tempo

De alcançares novas dimensões do amor

 

 

 

 

IMPROVISO

Caminhava pisando sobre os passos dele.

Anulada

Não deixava suas marcas,

Enquanto lágrimas furtivas

manchavam a máscara da face.

Cansada…

 

Até que um dia,

no mundo do improviso

sem aviso,

de uma só vez,

máscaras, marcas e dores

cansaram-se e

veio a libertação,

foi quando

todo o sofrimento dela se desfez

 

A partir de então,

o sofrimento dele teve a sua vez

 

(Da obra: TEMPO DE ESPERA e MÁSCARAS, de Sônia Moura)

 

ANULAÇÃO

Procurei por você

em todos os cantos da solidão,

cantei cantos falando de saudade,

escrevi poemas exaltando o regressar

mas você não veio…

 

Enrolei-me em lençóis de seda,

soltei um gemido de amor e de saudade

que ecoou, ecoou, ecoou…

mas acho que você não escutou…

 

No meio da noite,

a solidão me acordou,

e em um sonho estranho

me levou até um labirinto azul;

perdi-me na trilha,

não soube voltar,

e, ainda assim, você não voltou…

 

Cultivei palavras com gosto de hortelã,

molhei minha boca com gotas de romã,

enxuguei dos olhos lágrimas e quimeras

malhei o corpo, chorei a alma

me desgastei

e você não chegou…

 

Depois,

morta a esperança,

me recompus

e me impus

um novo viver.

Alijei fantasmas,

queimei lembranças

e me desfiz de você

 

*Da obra: Tempos de Espera e de Máscaras