CHOCOLATE, VÉU E GRINALDA

CHOCOLATE, VÉU E GRINALDA (Autoria: Sônia Moura)

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Olhava o véu e a grinalda sobre a cama e pensava na armadilha em que o destino a aprisionara, e ela não sabia se iria conseguir livrar-se desse enredo fatal.

O tempo passava rapidamente, os sinos tocavam ao longe, parecendo repetir o refrão dos versos de Alphonsus de Guimarães que diziam: “Quantas grinaldas pelo céu: Alguém decerto vai casar.”

E Violeta sabia que este alguém era ela, era ela.

Quem sabe não aconteceria um milagre e Gilberto desistisse de tudo, quem sabe? Talvez um anjo viesse salvá-la daquele desconforto, sim um anjo, porque ela sabia que os príncipes salvadores sobrevivem apenas nos livros de histórias infantis.

A mãe entrou no quarto, beijou a filha e lhe deu alguns conselhos, como boa mãe, naquele momento tinha um objetivo maior: ajudar a sua Violeta a ser a noiva mais linda entre todas.

A mãe não percebera ou fingira não perceber, Violeta deixava lágrimas molharem o véu de noiva que aguardava pacientemente sobre a cama.

Violeta pensava na Deusa do Amor, aquela que surgiu das profundezas e foi coberta pelos vapores da terra e do mar, como se estes vapores fossem véus. Quem sabe esta Deusa viesse em seu socorro e desse a ela a chance de fugir para bem longe e reviver, ainda que por um momento, os risos com sabor de chocolate que outrora tanta alegria traziam ao seu coração.

Sílvio e ela adoravam chocolate, gostavam de com ele se lambuzar e depois deixar o riso e a sensualidade brincarem junto com eles.

Agora, o véu e a grinalda já estavam em seu devido lugar e Violeta, “plantada” na porta da igreja, precisava desabrochar, aquela cena era suficiente para confirmar o que ela já sabia, ninguém viria salvá-la daquela armadilha, só ela poderia sair correndo dali, mas lhe faltava coragem.

A porta se abriu, a marcha de Mendelssohn deslizou altaneira por ouvidos emocionados e a súbita presença materializava um anjo que parecia dizer a ela, prossiga, tudo vai dar certo. O anjo sorria. Empertigou-se. Segurou firme o braço do pai e entrou com passos cadenciados para cumprir o ritual.

O padre, as luzes, o sorriso do noivo, as lágrimas da mãe, o sim, Violeta via tudo através do véu de noiva, as ilusões precisavam fugir para seus esconderijos. O show estava em andamento.

Após a cerimônia religiosa, foram todos para o salão comemorar, afinal, era uma festa maravilhosa e a noiva fez questão de que em tudo ou em quase tudo tivesse presente o chocolate.

E, assim, mergulhada no mar de chocolate, Violeta envolvida pelos braços do agora marido, florescia, apesar da erva daninha do passado teimar em vir sufocá-la.

Chocolate, véu e grinalda

(Do livro: Súbitas Presenças de Sônia Moura)

Um comentário sobre “CHOCOLATE, VÉU E GRINALDA

  1. Elisabete Pessoa disse:

    Adorei o conto, identifiquei-me com Violeta, não só pelo chocolate, que eu adoro, mas por, muitas vezes, ter de guardar as ilusões e deixar o show continuar, é necessário… Beijos

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