DISCURSO SOLTO NA RUA

 DISCURSO SOLTO NA RUA

DISCURSO SOLTO NA RUA (Sônia Moura)

 

      O discurso do artista de rua como um lugar de interação, onde os enunciados provocam novas modalidades de interlocução, o sujeito falante (artista/ator/autor/produtor/emissor) produz um enunciado capaz de fazer o outro sujeito (público/receptor) penetrar no universo do fazer artístico, através do portal do discurso construído por um eu, que multiplica a sua  fala sedutora para  todos.           

    Portanto, mesmo que seja em condições absolutamente adversas, o efeito nascido deste tipo de discurso ultrapassa as expectativas de qualquer modelo comunicacional, sendo esta mais uma constatação de que os signos lingüísticos, quando estrategicamente operados pelo emissor, conseguem surpreender, contaminando, até mesmo um passante distraído ou desinteressado.

Para Aristóteles: “O homem se compraz com a imitação”, cabe, pois, ao emissor, através do seu diálogo com o espectador, apagar as marcas visíveis da imitação, inserindo-lhe, pela sua fala, o ineditismo, fazendo-o crer ser verdadeiro o que, por vezes, é apenas verossímil.

Uma vez que o homem só tem acesso ao “real” através da linguagem, a palavra (protagonista), junto com outras formas de linguagem:  risos, olhares, convites gestuais,  no espaço público – barulhento, borbulhante, desordenado, febril, o discurso do artista de rua  une   subjetividades e  objetividades e estas unem o público num mesmo espaço  em torno de manifestações artísticas populares, assim sendo, cabe ao artista, que ocupa este espaço, seduzir o passante, possuindo-o com suas palavras, em forma de um convite direto, imediato, convencendo cada  transeunte de que ele é o eleito, o privilegiado, o escolhido a participar daquela festa.

A partir da conquista e da cumplicidade que é estabelecida pela força discursiva,  de uma forma ou de outra, todos passam a participar das apresentações artísticas, uma vez que todos – artista, público participante ou público assistente – riem, brincam, se espantam, se encantam, duvidam, e neste instante, o artista constrói, através do seu discurso (que também faz parte do seu fazer artístico) e de sua arte, similaridades comportamentais, quando coloca no centro da roda,   por meio de sua imagem – presença, a imagem de uma arte “feita naquele instante”, “saída agorinha do forno” para a degustação do seu público, que está dividindo interesses comuns e partilhando sentimentos, no meio de uma multidão que, em geral, sequer se conhece.

Para Charaudeau (p. 28), O sentido do discurso depende das circunstâncias da enunciação e dos destinatários aos quais o discurso é dirigido”, deste modo, o enunciado que circula pelo espaço público apresenta traços diferenciados e é  dirigido a um público totalmente heterogêneo, o qual ouve uma voz que se volta para  a ampliação do apelo e da sedução e esta voz obtém como resposta a participação de uma assistência relaxada, envolvida, persuadida a ficar, neste instante, porque o público espectador foi apanhado pela rede do discurso competente do emissor, um discurso que apresenta duas faces: a face conotativo (significado ideológico:  “a venda de um produto”) e a face denotativa (literaridade aparente do discurso artístico) .

 

(UFF – 2009)

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