ESPADA

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ESPADA (Sônia Moura)

 

Habitando o silêncio das palavras vãs

Uma mórbida metamorfose

Ao vivo, mas sem cores, acontece

Num canto qualquer da alma

Quando, ao léu, se vão antigos amores

A partir daí, não haverá mais nada,

Nem mesmo poesia

Nem mesmo boemia

Só lágrimas ocultas

Vestidas de desilusão

Por um tempo,

Sobreviverão ao caos

Mas depois,

Como o tempo, irão se esvair

E irão se deixar morrer

Pela lâmina de uma espada

Celestial, ancestral e cabal

Para nunca mais voltar

(Da obra: Coisas de Adão e Eva, de Sônia Moura)

DECLARAÇÃO

o ritmo da poesia

 

DECLARAÇÃO

Na poesia, a palavra é arte,

Não uma arte qualquer

É palavra transformada

Em vocábulo raro

Convertido em anteparo

 

A palavra, na poesia,

É uma coisa louca

Coberta de lucidez

Que alguém mais louco (re)fez

 

(Da obra: POESIA – DIA A DIA  DE Sônia Moura)

ALENTO

ALENTO (por Sônia Moura)

 

Sou mãe!

Sou avó!

Sou filha!

 

Da vida

Segui a trilha,

Amei, sonhei

Casei, descasei

Mil papéis

Desempenhei

 

Mas, o que de fato sei

É que com todos os sins

E também todos os nãos

A luta e a glória

De ser MÃE

Alentam o meu coração

 

(Da obra: Coisas de Adão e Eva)_alma_gemea_ii

Mãe é tudo isso

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 MÃE É TUDO ISSO (por Sônia Moura)

 

Mãe é concha

Que guarda e liberta

Mãe é boba e é esperta

É silêncio e é barulho

É claridade e é escuro

Quando a um filho

Precisa defender

É pedra e é bicho – fera

Mas é algodão e beija-flor,

Quando destila amor

 

Mãe é ave e é ovo

Para seu filho gerar

E também para proteger

Mãe é aço e é bolha de sabão,

Ao seu filho conceber

Mãe é calor e é sol

Para seu filho agasalhar

Mãe é doce e é o pão

Para seu filho alimentar

 

Mãe é tudo isso e muito mais

Desdiga-me quem for capaz!

 

(Da obra: Coisas de Adão e Eva)

Marcha à ré (ou Tempo do Rei Velho)

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CAPÍTULO VI

Marcha à ré   (ou Tempo do Rei Velho)

 

Ao avô, do passado narrador,

Disse o jovem e atento ouvinte:

– Meu avô, para ser bem franco,

Ao ouvir suas histórias sobre o ontem,

Quando a vida era revelada em preto e branco

Nos livros, nas revistas, nas telas

Do cinema ou, mais tarde, da tv,

Senti que tudo era muito diferente

Daquilo  que hoje se vê

 

Porque…

A fruta madura e colorida saía do pé

Para a boca faminta,

Sumo escorrendo pelo rosto

E se comia com gosto

Sem tantos  “isso não pode”

Sem tantos “isso faz mal”,

Mal fazia beber leite e chupar manga

Mal fazia lavar os cabelos depois do almoço

Hoje é até engraçado,

Mas antes isso era um alvoroço

 

Era tudo tão simples…

O ovo vinha do quintal ou da granja,

As verduras da horta ou da quitanda

Na calçada, brincava-se de ciranda

À tardinha, das cadeiras admirava-se

Todas as cores do entardecer

 

Rendo-me solenemente ao passado

E com júbilo confesso:

– Tenho certeza de que, naquele tempo,

O mundo era muito mais pitoresco

E, com certeza, bem mais colorido

Ainda que fosse ilustrado e apresentado

Somente em preto e branco

 

[Da obra Tempo Absoluto e Tempo Relativo de Sônia Moura]

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OLHO DA CORUJA

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OLHO DA CORUJA (por SÔNIA MOURA)

 

No fundo do olho da coruja

Vi metáforas raras que

Falavam sobre um tempo

Em que não havia isolamento

Diferente da realidade de agora

Em que no bosque desfigurado

Vigora o silêncio

E o lamento.

Só lamento!

 

(Da obra: COISAS DE ADÃO E EVA, de Sônia Moura)

 

VAZIOS

VAZIOS (por Sônia Moura)

 

 

Para o banco vaziobancolilases

Ela lançou um olhar sombrio

Sentiu muita inveja

Das flores ao lado

O que desejava?

O que mais queria?

Que ele voltasse

E com ela ficasse

No banco vazio

E em meio a carícias

Enchesse de novo

O seu coração

Agora vazio

 

 

(Da obra: Coisas de Adão e Eva)

SAUDADE

DESTINO

Saudade

 

Saudade

É retrato desbotando na parede

É o tempo balançando na lembrança

É bruxa e fada nos trazendo a infância

É o terror vestido de esperança

 

Enfim

Saudade arde mais que pimenta

Fere mais que lança de batalhas

E nos faz viver devorando migalhas

De uma resposta esperada que não vem

Enquanto a angústia cruel nos atormenta

 

(Da obra: Coisas de Adão e Eva, de Sônia Moura)

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GARGANTA

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Garganta {por Sônia Moura}

 

A saudade se enfronhou em meu destino

E desandou a cobrar uma solução

Que desse paz ao meu coração

 

Estufei o peito e disse a ela:

– Esse caso eu resolvo, com ele não mais me envolvo,

Ele é passado, está do mapa riscado

 

Plantei um pé de comigo – ninguém – pode

Coloquei um galho de arruada na orelha

Para espantar qualquer mandinga

Agora só faço o que me der na telha,

Com ele não fico mais

Saiba, dona saudade, disso eu sou capaz

 

Ele deve ter outra, ela disse,

Eu retruquei confiante:- Nem quero saber de mais nada,

Só quero seguir adiante

 

O telefone tocou, a voz do outro lado sussurrou:

– Hoje podemos nos ver? Quero namorar você

Pronto, deu-se a desdita!

Assim não há quem resista, como posso dizer não

A razão vai perder feio, no jogo com a solidão

 

Lá se foram as certezas,

Lá se foram as brabezas

Lá se foram as promessas…

 

Como na vida ou na novela

A história se repete…

Lá fui eu toda coquete

Igual a uma perdida ovelha

Rindo de orelha a orelha

Cair na velha esparrela

E caindo mais uma vez

No velho conto do vigário

Que serve para pegar um otário

Como o meu bobo coração

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{Da obra: Coisas de Adão e Eva, de SôniaMoura}