CURVAS NA SEARA DE VENTO – II (Exemplificando…)

 CURVAS NA SEARA DE VENTO – II (Exemplificando…)

CURVAS NA SEARA DE VENTO – II (Exemplificando…)

 (UFF – Seminário – 2008)

A título de exemplificação, selecionamos passagens da obra de Manuel da Fonseca – Seara de Vento- nas quais o verbo curvar-se e outros vocábulos com significações aproximadas ao verbo curvar-se, destacam-se, dando respaldo a nossas colocações no texto do mesmo título, publicado em 18/05/2010, neste blog.

 

 

*CURVAR-(SE) – ABAIXAR, ABATER, AGACHAR, AJOELHAR, ARQUEAR, DOBRAR, EMPENADO, ENCOLHER, ENCURVAR, FLECTIR FLEXIONAR, HUMILHAR, INCLINAR, PENDER, PROSTAR, ROJAR, SUBMETER, VERGAR (*-SE)

 

·       Júlia  encolhida e receosa, como se acabasse de ouvir uma blasfémia. (medo/mãe)  11

·       A curva das costas de Júlia, muito magras, aumenta mais o seu ar de desalento. Triste e fraca, parece vergada ao peso da culpa ou de um remorso. 12        *

·       Amanda Carrusca encolhe-se , de face sumida no bioco do lenço. 14

·       O tom de ameaça confrange as mulheres. Curvam-se mais ainda,… 15    *

·       De mão no ar, cresce sobre Júlia que se dobra desamparada.  17

·       Meio zambro, esquelético, o queixo encostado ao peito, (Joaquim Valmurado) erra pelo terreiro… 19

·       Todo arqueado (Joaquim), estende os braços para as ruínas do forno.  20

·       Prostrado (Joaquim), queda-se a cogitar diante dos pedregulhos. 20

·       (Amanda) ao descer do banco, meio curvada, olha intencionalmente… 25   *

·       (Júlia) Ajoelha-se e ensopa a ponta do lenço. 28

·       (Bento) Entontecido, curva-se para o umbigo. 32                   *

·       (Bento) …a cabeça pende-lhe para o umbigo. 33

·       Todo curvado debaixo do alforge, João Carrusca… 35           *

·       … o corpo afrouxa, verga. (João)

·       A velha baixa as pálpebras, curva-se.  41                   *

·       (Amanda) Toda dobrada, apara as arremetidas do Bento… 42

·       (Amanda) Encolhe a cabeça entre os ombros aguçados.  45

·       (Júlia) Frouxa, de ombros descaídos, senta-se à lareira.  52

·       (Palma) Meio curvado, desanda pelo mato dentro.  54               *

·        O pastor detém-se todo curvado, numa ameaça.   55                  *

·       Palma… apanha o chapéu e atravessa a clareira, meio curvado   57       *

·       Júlia curva-se sobre a tigela fumegante          63              *

·       (Palma) De peito arqueado, ajeita as calças         64

·       ……dobra-lhe a aba do chapéu  77

·        Tombada para a nuca, a larga aba  negra do chapéu…. 78

·       Curvados sob as cargas, os homens emergem do chão negro…. 87        *

·       Júlia e Amanda Carrusca curvam-se.              122              *

·       (Palma) Atirado de joelhos contra o chão, dobra-se todo           147

·       Uma dor fina dobra o corpo de Júlia           166

·       (Palma) Enfadado, encolhe os ombros.            175

·       (Júlia) De joelhos, tombada                 177

·       Mas Diogo, sempre curvado                187          *

·           Homens trazem o caixão….De cabeças vergadas.          190

·       Palma recua…..ao curvar-se              196                 *

·       (Palma) Curvado, espia por cima dos arbustos.        203         *

·       De boca escancarada, joelhos dobrados, Elias sobral…       204

·       Transida, Lina abaixa  a cabeça. As pernas dobram- se –lhe        205

·       O Palma curva-se                       213                 *

·       O frio repassa-o, dói-lhe o corpo de andar tanto tempo curvado.     215     *

·       (Guarda)  Um deles, curvado               226         *

·       (Palma) Curva-se e rompe a calça.             227              *

·       Mariana dobra a cabeça para o peito.          230             

·       (Palma) A violência da emoção verga-lhe as pernas. Cai de joelhos…233

·       (Palma) A rajada apanha-o pelo tronco de alto a baixo, curva-o.      244     *

 

………………………….*************************…………………………

 

* FONSECA, Manuel da. Seara de Vento. Lisboa: Editorial Caminho, 1988.

 

 

SAUDADES DO VERÃO!

SAUDADES DO VERÃO!

Olho para o relógio, ele marca 17h 38min e já está escurecendo.

Paro, vasculho o tempo, sinto o frio e penso:

-Para quem mora numa cidade luminosa e iluminada como o meu Rio de Janeiro, como é triste ver a noite chegar tão cedo!

SAUDADES DO VERÃO!

SAUDADES DO VERÃO!

A PÉROLA E O AMOR

 A PÉROLA E O AMOR

A PÉROLA E O AMOR  (Autoria: Sônia Moura)

 

Nas águas da ilusão

Nadando na contramão

Mergulhei num mundo mágico

Cheio de corais e flores

Procurava pela verdade

Aquela que esconde

Todo o mistério do amor

 

Fingindo estar bem à tona

Mas, muito bem escondida

Nas dobras do coração,

E nas nuvens da sedução,

A verdade do amor

Assistia à minha aventura

E a minha loucura, aplaudia

 

Ao buscar do amor a verdade

Tive que ir bem fundo

Até o fim da cavidade

Vasculhei águas do mundo

Levantando muitos véus

Numa procura ao léu

 

Depois de muito procurar

Pelas entranhas do mar

Mergulhei mais fundo ainda

E não encontrei a verdade

Descobri que a verdade do amor

Espreitando-me por um fresta

Do dique que iria arrebentar

Antes mesmo de a festa começar

Confabulava com a saudade

Dizendo que a mim

Logo iria se mostrar

Foi quando uma pérola perfeita

Sobre meus pés se acomodou

E uma voz no mar se ouviu

E dizia: – Aqui estou!

 

E eu, tola e muito crente,

Sorria pra toda gente

Dizendo: – Achei, achei!

Então mostrei

O que eu julgara que fosse

A verdade do amor

A todos que encontrei

Era uma pérola tão linda

E tão dura quanto uma pedra

Nascida do sofrimento

De uma ostra apaixonada

 

Mas, que nada!

Eu estava enganada

Pois a verdade do amor

Mudara-se pela manhã

Para um colorido coral

– Onde estás, gritava eu,

Mas ela não respondia

E cada vez mais se escondia

Deixando-me a ver navios

Mostrando-me um desafio

Difícil de enfrentar

Então

Desisti de esta verdade decifrar

Porque a verdade do amor

Não deseja se revelar

Para encontrá-la

O melhor que se faz é amar

 

 Assim, jogando o sal ao vento

Seguindo  o meu destino

Deixei o fundo do mar

E fui fundo no doce do amar

Deixei a verdade exilada,

Presa nas profundezas do mar

Quem quiser que vá buscá-la

Agora eu só quero amar…

 

(Do livro: Coisas de Mulher de Sônia Moura)

 A PÉROLA E O AMOR

CURVAS NA SEARA DE VENTO

 CURVAS NA SEARA DE VENTO

CURVAS NA SEARA DE VENTO  (Autoria: Sônia Moura)

(UFF – Seminário – 2008)

Em Seara de Vento de Manuel da Fonseca, o verbo curvar-se e seus sinônimos se apresentam como metáforas- síntese do romance, dando a estas palavras mobilidades significativas capazes de mostrar os múltiplos aspectos de uma realidade que o texto irá ficcionar. Assim, as denúncias reveladoras do estado sócio- político em Portugal, entrega ao leitor a forma visível deste momento histórico que tenta tornar o homem invisível pois, como dizem George Lakoff e Mark Johnson em Methaphors we live by: “… na maioria dos casos, o que está em evidência, não é a verdade ou falsidade de uma metáfora, mas as percepções e inferências tiradas dela e as ações sancionadas por ela.”..

Na base do sistema conceitual da expressão curvar-se, encontramos diversas referências metafóricas: gesto de humildade práticas orientais, humildade, adoração e submissão – religiões (judeus, cristãos, muçulmanos, espíritas), curvar-se ante a beleza/ admiração e outros. Metaforicamente, também encontramos, a expressão curvar-se diluída pela presença do verbo cair: “cair de quatro”; “cair de amor”.

Nesta obra de Manuel da Fonseca, a expressão em destaque desdobra-se em muitas possibilidades significativas, como metáfora recorrente, cuja base está voltada para a idéia de sujeitar-se a; ser obrigado a ou  estar sujeito a –, neste contexto, esta metáfora e suas diversificações referem-se à sujeição política a que estavam expostos os personagens da estória e da história.

Assim, pela presença e mobilidade da força metafórica, alguns aspectos: tristeza, infelicidade, submissão, ódio, impotência, indiferença, descaso, pactuações, sofrimentos e violências evidenciam-se na narrativa e explodem aos olhos do leitor, dando ao texto uma força subjetiva, pelas transposições de sentidos de representação da realidade discursiva, ratificando, deste modo,  o que afirma Paul Ricouer, “não há metáfora viva no dicionário e sim no discurso”.

O vocábulo curvar-se e seus sinônimos são empregados como metáforas in absentia  – nas quais o veículo está presente e o teor, ausente- deixando ao leitor o dever e o prazer de descobrir o teor e o que constitui a similaridade entre elas e o veículo, e, por meio de conceitos (in)distintos a sociedade e seus pilares – público ou privado, são apresentados ao leitor pela força da representação da linguagem e de suas relações contextuais.

Aristóteles considerava que as imagens poéticas, ao criarem transposição de sentido, como acontece com as metáforas, introduzem um elemento imprevisto e estranho, deste modo, eclipsado.

Nesta obra, o teor metafórico reprisa o momento vivenciado pelos personagens oprimidos e também eclipsados por uma sociedade na qual, várias formas de violência destroem e destronam o indivíduo e a família, limitando espaços físicos, psicológicos e sociais, fazendo com que as fronteiras do público e do privado se curvem ao momento histórico, provocando no leitor o  desejo de decifração das tensões textuais e sociais.

Na maior parte da narrativa, as expressões metafóricas do verbo curvar-se apontam personagens submersos no caos social, impossibilitados de comunicar-se, de lutar, de sentir alegria; colocando-os na condição de isolamento social e familiar. É por meio do teor metafórico que suas vozes explodirão, elas virão nas asas do vento e serão espalhadas pela seara e pelas sendas narrativas, pois o autor animiza o vento e a este é dado o poder de chorar, gritar e sussurrar pelos personagens.

O compromisso ideológico do neo- realismo parece curvar-se para captar (ou ser captado?) por estas metáforas que guardam em si uma acumulação imagística atenta a uma realidade subjetiva que se apresenta despojada de ornamentos e submetida à força metafórica da palavra curvar(-se) e de suas múltiplas associações e seus vários significados, para incorporar-se à própria realidade capturada pela ficção e permitir ao leitor um perfeito encontro com esta.

  Referências Bibliográficas

 

FONSECA, Manuel da. Seara de Vento. Lisboa: Editorial Caminho, 1988.

LAKOFF,George e JOHNSON, Mark. Metaphors We Live By. Chicago, The University of Chicago Press, 1980.

RICOUER, Paul. La Metáfora Viva. Buenos Aires, Ed. La Aurora, 1977.

PONTES, Eunice (org.).  A Metáfora. Campinas: Editora da UNICAMP, 1990.

 

O IMPONDERÁVEL

O IMPONDERÁVEL

O IMPONDERÁVEL  (Autoria: Sônia Moura)

 

Era mais ou menos como estar isolado em uma ilha, Alice estava só em seu mundo, em sua ilha, presa ao imponderável.

Imersa em seus pensamentos, imaginava Ramiro nos braços da outra, não haveria testemunhas, havia somente a solidão a brincar, libertina, com os sentimentos alheios, enquanto o olhar de Alice vagava pela fantasiosa ilha dos amores, de todos os amores pintada em sua memória, em seus mais belos sonhos.

Embora quisesse seguir o seu caminho, Alice sempre se afastava dele, pois em sua linha da vida só a figura de Ramiro parecia desenhar o seu destino, ainda assim, algumas vezes e sem muita convicção, a mulher tentara livrar-se da tatuagem incrustada em suas lembranças, mas estas foram tentativas vãs, ainda que tentasse, a moça não conseguia apagar as profundas marcas do passado, não conseguia libertar-se da prisão sem grades onde se metera e de onde não conseguira mais sair.

O mundo rodava tão devagar, pensava Alice, enquanto sua cabeça rodava muito depressa, mas para ela nada saira do lugar,desde que o seu amor partiu, sem dizer adeus. Em seus pés, uma imensa bola de ferro, também invisível, a imobilizava mais ainda, evidenciando aquele surreal prisão concedida e negada.

Era preciso fugir daquela clausura em que se metera, mas como se ela ainda sentia que aquela dor era essencial para que pudesse continuar sentindo-se viva? Mas como se aquela estranha sensação confundia-se com a evidente verdade: ela precisava voltar à vida, de fato, mas não queria livrar-se da presença de Ramiro?

Em seus pensamentos, setas apontavam para várias direções, bastava que ela escolhesse uma delas para fugir dali, Ariadne tinha deixado seu fio, portanto Alice deveria seguir por ele e encontrar a saída do labirinto.

Mas a amargura e dor plantadas em seu coração dificultavam a escolha de um caminho e, assim, na obscuridade total, Alice inundava seu silêncio com palavras rudes, com as quais desejava manchar a imagem daquela que a deixara, mas, sem permitir que ele sumisse de sua vida, sem deixá-lo partir para sempre.

A cada tentativa, uma nova recaída, e lá ia Alice refugiar-se no seu fantasmagórico país das maravilhas, escondido no oco de sua mente. Isolara-se do mundo real e criara um mundo de angústia e fantasia, no qual um lindo castelo lhe servia de abrigo e reforçava a sua solidão.

Encerrada em si mesmo, Alice só conversava com os seres imaginários do seu país das maravilhas e só transportando-se para este mundo ela podia sonhar, lá ela podia fazer uma condensação expressiva dos melhores dias de sua vida de outrora e revivê-los a hora que ela bem entendesse .

O tempo foi passando e Alice não viu que a erva daninha crescia ao redor de seus sonhos e os sufocava lentamente, e, junto com a morte de seus sonhos, o castelo construído por sua solidão ia desmoronando aos poucos e, no final desta história, o seu mundo tornou-se totalmente escuro, ninguém mais habitava o seu país da fantasia e Alice acabou seus dias sozinha.

 

Do livro: COISAS DE MULHER de Sônia Moura)

 

 O IMPONDERÁVEL 

DOMINGO MAMÃE

                                                                                DOMINGO MAMÃE

DOMINGO MAMÃE  (Autoria: Sônia Moura)

 

Domingo

Chuvoso

Manhoso

Dengoso

 

Domingo

Com gosto

De carinho

De ninho

 

Domingo

Para animar

O coração

Acordar

A emoção

 

Domingo

Ornando

Uma manhã

Louçã

 

Domingo

Em forma de

Poesia

De alegria

 

Domingo

Em flor

Em tons de

Amor

 

Domingo

Bordado em

Rosas

Para mamãe

Oferecer

E docemente

Dizer

Mamãe,

Amo você!

 

(Do livro: Coisas de Mulher de Sônia Moura)

 DOMINGO MAMÃE

 

 

 

MÃE, MÚLTIPLAS IMAGENS!

                                                                               MÃE, MÚLTIPLAS IMAGENS!

MÃE, MÚLTIPLAS IMAGENS!(Autoria:Sônia Moura)

 

Mãe é este segredo que muitos, especialmente os poetas das palavras ou das tintas, tentam retratar e até conseguem dela mostrar algumas nuances, no entanto, nem mesmo os poetas, os pintores ou os escultores conseguem mostrar o amor materno em toda a sua plenitude.

Mãe é aconchego, é carinho, é atenção, é bronca.

Mãe é a mais bonita; é a mais feia (quando está de cara feia); mãe é manhã, tarde e noite; é primavera, verão, outono e inverno.

Mãe é lua nova, quando nos olha com doçura, ainda que já tenha chegado aos oitenta; é lua cheia, quando mostra o seu cansaço, porque todo mundo sabe, cuidar da prole não é fácil não; é lua crescente, quando nos coloca debaixo de suas asas, quando nos defende e nos protege; é lua minguante quando o seu sorriso some porque seu filho está doente.

Mãe é a forma humana que representa o mais inviolável do ser, é uma forma de vida superior (que me perdoem os pais), é quase uma transcendência divina.

Com sua presença em nossas vidas, o mundo se transforma num lugar pleno, mas quando sua ausência acontece, nosso mundo se transforma num lugar de total e irrevogável carência.

Sempre se metamorfoseando, ora lagarta, ora borboleta, ora ovo, ora ave, ora fada, ora bruxa, ela é este contraste, esta oposição barroca que ocupa um lugar muito especial em nossas vidas e, assim, seja na superfície ou nas profundezas da poesia, simbolicamente:  “Mãe é este encantamento barroco!”

(Do livro: Coisas de Mulher de Sônia  Moura)

      MÃE, MÚLTIPLAS IMAGENS!                 

FAÇA SEU PEDIDO

FAÇA SEU PEDIDO              

 

FAÇA SEU PEDIDO  (Autoria: Sônia Moura)

                                                          

         Alô, alô! Aqui, para, aqui!

         Olha a carta….olha é mágica, quer ver?

         Olha como é legal! Não sai carta repetida, quer tentar?

         Não corra que a vida é curta, para, olha o “show”!

         Vem, vou começar agora….

         Ah! Não resistiu, meu “show” é muito bom…

         Olha quanta gente…

         Aqui você brinca e se diverte, quer tentar?

         Senhores, é só esperar, o show é bem bolado, o senhor veja esta rosa, vou fazer desaparecer….

         Agora, meu assistente vai dar uma  pirueta que nunca foi tentada…1, 2, 3 e já ….

         Olha vou ensinar, segura aqui (a carta, o livro, um pedaço de madeira), presta atenção, a cobra vai sair do saco…, agora ela levanta, pensa forte, pensa forte… Será que esta cobra não levanta mais?…

         Escolhe uma carta, pensa numa coisa que você quer. Pensou? Pensa bem forte, pensa em coisa bem boa. Agora meu assistente vai consultar o céu…

         Ele conseguiu, senhoras e senhores, a cobra levantou!..

         Quem quer tentar, é só pensar forte, tirar uma carta e conseguir tudo o que quer, eu ensino…

         Agora é a vez da madame, o homem ali já conseguiu…

         Vem, Madame, pode pedir…

         Escolhe uma carta, pensa numa coisa que você quer. Pensou? Pensa bem forte, pensa em coisa bem boa. Agora meu assistente vai consultar o céu…

         Ih!!! A Madame dificultou…

         Ô madame, assim você me derruba, tá pedindo um amor eterno e verdadeiro, assim não dá…

 

(Fim do Show)

 FAÇA SEU PEDIDO

 

MULHERES REBOCADAS


MULHERES REBOCADAS (Autoria: Sônia Moura)  MULHERES REBOCADAS

 

Raptaram  a Helena

Dizem que ela era um pedaço!

Roubaram as Sabinas

Faltava mulher no espaço

Esculpiram  a Vênus

Espetacular, mas sem braço

Desenharam Afrodite

A deusa que do mar chegou

E aos deuses endoidou

Tentaram a Eva

Mas, dizem que foi ela

Que ao “pobre” do Adão tentou

E a boboca se calou

E a fama de pecadora

Eternamente levou

 

(Os homens não suportam a solidão,

Da mulher não abrem mão

Só não sabem como com elas lidar

Por isto capturam, roubam, esculpem

Desenham tanta mulher

É um jeito de tentar nos dominar

Ou é um jeito de mostrar

Que a nós estão a se curvar?)

 

Pra nos honrar temos a Lilith

Sabia que ela se rebelou?

Abandonou o “pobre” do Adão

Não quis ficar por baixo dele

Em nenhuma forma de relação

Protestou dizendo assim:

Eu também fui feita de pó

Por isto sou sua igual

Vou ficar por cima, que tal?

Juntou-se a anjos caídos

Casou-se com quem bem quis

Voltou e tentou Adão

Foi chamada de demônio

Foi em frente

Deu de ombros

E dizem as boas

E as más línguas

Que vive num paraíso

E é muito, mais

Muito feliz,

Pois se libertou do jugo

E sempre fez o que bem quis!

 

(Do livro: COISAS DE MULHER  de Sônia Moura)

 

 

                                             

GOTA D´ÁGUA

 lagrimaa.jpg

 

GOTA D´ÁGUA (por Sônia Moura)

 

Maria acordou com lágrimas nos olhos, embaçando o raiar do seu dia, era o coração que lhe saltava pelos olhos.

As coisas do coração são, quase sempre, lançadas ao mundo através dos nossos olhos ou dos nossos olhares, pois são eles que liberam, gota a gota, nossas emoções, que saltam como as águas das lindas corredeiras ou apenas em forma de uma gota d´água ou como uma quantidade tão grande de uma catarata em época de cheia, de qualquer modo, em nossos olhos a tristeza brota como um olho d´água e quem sabe em que mar a dor irá se transformar? Pensei cá com os meus botões.

Para aplacar a dor e a tristeza por um amor que estava se esvaindo, ela começou  a cantarolar baixinho e num tom nublado, como esta manhã de quinta- feira, a canção do grande Chico Buarque que diz assim:

                       

“Deixe em paz meu coração,

ele é um pote até aqui de mágoa,

e qualquer desatenção,

faça não, pode ser a gota d´água…”

 

Olhei aquele rosto de menina e comparei-o os seus olhos marejados em aos meus em um tempo que já vai longe. Constatei que em qualquer tempo a dor da perda, de qualquer perda, ou mesmo da ameaça desta, é sempre igual.

Voltei no tempo e me vi menina a chorar por um amor perdido e que jamais iria voltar. A dor da solidão pode ser comparada a um bosque escuro, que não é visitado por passarinhos, em cujas árvores não nascem flores nem frutos, nela também não há borboletas, nem lagartas, pois as raízes de suas árvores apodreceram. Neste bosque, só mora o silêncio amedrontador, não há risos, só o som de prantos se faz ouvir.

Nesta hora de dor, quase sempre as palavras perdem o sentido, ficam amareladas, gastas, sem força, sem nexo, elas colidem nos ouvidos sofridos e lhe embaralham a mente, enquanto  a clareza vai morar noutro lugar.

Esbocei algumas tímidas palavras para dizer àquela menina que só o tempo poderia ajudá-la, mas desisti, não iria convencê-la a não se deixar sofrer tanto assim, pois sei que, naquele momento,  isto seria impossível.

Ainda assim, disse-lhe que os densos bosques, um dia recebem a luz do sol ou o brilho do luar ou de alguma estrela pode penetrar-lhe as entranhas, fazendo-o florescer outra vez, para que todos venham banhar-se em seus rios, comer de suas frutas, descansar à sombra de suas árvores, pois os gnomos e as fadas da floresta virão para desfazer este sofrer de algum ser malvado que estava destruindo este amor.

Ela riu um riso com cheiro de flores silvestre e em seu olhar duas estrelas, ainda que meio apagadas, recomeçavam a brilhar.

 

(Do livro: Coisas de Mulher de Sônia Moura)

 

 

 

 

 

 GOTA D´ÁGUA