PENEIRAS

 PENEIRA

PENEIRAS (Autoria: Sônia Moura)

Do outro lado da rua, o homem peneirava a areia, enquanto Denise peneirava as palavras.O homem precisava construir a casa; Denise precisava construir seus textos.
Por alguns instantes, pararam suas tarefas e deixaram seus olhos se encontrarem, e, ainda que a distancia os separasse, a força do olhar se fez presente.
O vento espalhava alguns grãos de areia que o homem peneirava, mas a maior parte caía dentro do recipiente adequado; o pensamento espalhava alguns grãos de palavras que a mulher peneirava, mas a maior parte ficava grudada na tela do computador, e, em ambos os casos, não se sabe ao certo se o que ficava nos devidos recipientes era o melhor, no entanto, era com estes grãos que o homem e a mulher iriam construir suas obras de arte, deixando para o mundo a sua visão de mundo.
Mais uma vez, os olhos se cruzaram e este encontro de olhares repetiu-se por alguns dias, enquanto sentimentos eram peneirados.
Juntando areia, terra, cimento e pedra, o homem dava forma à sua obra, juntando ideias e palavras, a mulher dava forma à sua obra.
Ele se arriscava, construindo algo novo: novas formas de uma nova arquitetura. Com certeza, aquela era uma obra diferente.
Ela se arriscava, construindo algo novo: novas formas de um novo texto. Com certeza, aquela era uma obra diferente.
O tempo passava e as obras iam tomando forma. O tempo passava e os olhares iam dando forma à casa e ao romance. Cresciam as obras, crescia o desejo. Precisavam se encontrar.
Enquanto eles terminavam suas obras, o destino também peneirava a vida e tecia a sua obra.

Assim,  numa manhã de domingo, a súbita presença da arte uniu o casal. Encontraram-se numa feira de artesanato, se reconheceram, se aproximaram, peneiraram as diferenças sociais e construíram a sua melhor obra: um novo rebento.

(Do livro SÚBITAS PRESENÇAS de Sônia Moura)

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