Quem afiou a Machado de Assis? (por SÔNIA MOURA)
Teria sido Lima Barreto ou, mais contemporaneamente, Lima Duarte?
Esta e outras perguntas faziam parte de um repertório das chamadas ”perguntas tolas”, que só serviam para divertir, alegrar.
Vejamos alguns exemplos:
1- Quem é o centro avante do ataque cardíaco?
2- Em perna de pau nasce pelo?
3- Linha de ônibus serve para costurar?
4- Quem nasce na ilha da madeira é cara de pau?
5- Quantos filhos tem o pai Sandù?
6- Pé de alface tem chulé?
(Esta era uma inocente brincadeira de tempos que lá se vão.)
A bem da verdade, o que era afiado em Machado de Assis era o seu humor que, para alguns, beirava o cinismo, e também era sinônimo de uma ironia, que andava em perfeita sintonia fina com a vida.
Para outros, o humor machadiano era a prova viva de uma inteligência sagaz.
Quem afiou sua mente para que ele conseguisse penetrar com tanta audácia e certeza nos meandros da psique e da alma alheia?
Quem afinou sua pena para que ele ousasse conversar com o leitor, chamando-o para o centro da roda narrativa, o que acaba por tornar leitor e autor cúmplices do que estava sendo narrado?
Quem afinou a lógica da escrita machadiana que, através de períodos curtos, diretos, alcançava o objetivo desejado, prendendo a atenção do leitor, sem deixar o texto tornar-se tedioso, a fim de que a leitura fosse o mais possível prazerosa.
Este afiado Machado de Assis era um implacável crítico da sociedade e do ser humano, sabia como “limar” as aparências, buscando revelar ao leitor os lugares secretos das ações humanas, as essências da vida, através da análise do mundo interior dos personagens.
A afiada ironia machadiana, na maioria das vezes marcada por pinceladas amargas e até mesmo beirando à crueldade, arranca feroz ou brandamente as máscaras que escondem os muitos jogos de interesse circulantes na sociedade, fazendo vir à tona uma descrença mostrada por um desespero quase velado, para que as nuances da alma humana fossem reveladas.
Preclaros leitores, de fato não sabemos quem afiou o Machado de Assis, mas, certamente, podemos afirmar que a sociedade da época e tudo mais que ela representava naquele “novo” mundo, por meio de suas descobertas e idéias revolucionárias, ajudaram a afiar este escritor genial e sua obra, por meio da qual ele se mostra um observador do mundo, de seus pares e de si mesmo, sendo ao mesmo tempo caça e caçador.
Machado de Assis foi e sempre será o maior gênio da nossa Literatura, um autor que soube como ninguém entender a mente e as frustrações humanas!
Foi Negrão de Lima.
Foi Negrão de Lima.