COTIDIANO (Autoria: Sônia Moura)
O céu da ilusão foi tingindo
Meu querer em vários tons
Em muitas emoções, em alegria
De infinitos sons
Depois, o céu da desilusão
Em um só tom, sem emoção
Tingiu meu coração
De nostalgia, de agonia
Então, o que era encantamento
Tornou-se descontentamento
E o abstrato do amor
Deu lugar ao concreto da dor
Só me restava lamentar
O paraíso perdido
O lugar sonhado
O amor imaginado
Hoje, o que resta da ilusão
É a cor da recordação
Plantada nos ramos da saudade
E no céu do meu caminho
Borboletas azuis batem levemente
Suas asas
Em movimentos lentos
Para meu sofrer aplacar
Lá longe,
No meu mar cinzento
Golfinhos dourados
Saltam nas águas a me consolar
Eles sabem do meu segredo
E sabem que meu sofrer
Não é brinquedo
Só querem minha dor apaziguar
Sou agora
Um jardim abandonado
Uma praça sem crianças
Sem escorrega ou balanços
Enquanto minha vida
Segue a balançar
Para que a saudade de um tempo
Penetre em mim
Chegando mesmo a me ferir
Preciso suportar a dor
Deixar expostas as feridas
Deixar o sangue escorrer
Preciso segurar a vida
Pela raiz
Antes que ela me fuja
Preciso deixar a realidade
Penetrar em meu nariz
Chegar aos pulmões
Revolver emoções
Desfazer canções
Enchendo o oco
Encravado em minh’alma
Preciso sentir o sumo
Das frutas outonais
Sentir a liberdade
De uma andorinha só
E conseguir abandonar
O frio inverno
Embaralhar-me com as flores
Da gentil primavera
Para renascer
No próximo verão
(Do livro: COISAS DE MULHER de SÔNIA MOURA)
Seu poema está muito bonito. Gostei dos versos”… do abstrato do amor/ao concreto da dor…” Com o passar do tempo. chegamos à conclusão que tudo é abstrato. Concreto mesmo só é, enquanto duram, o amor e a dor. Mas, lembrei-me do Monsueto: “…mora na filosofia/ pra que rimar amor e dor?…”. O seu poema se torna belo porque o renascer está presente. O renascimento é sempre concreto para os fortes.
Olá Sônia, belo poema…Espectacular….