MISTÉRIOS

                            MISTÉRIO

 

 

MISTÉRIOS (Autoria: Sônia Moura)

 

 – Tem gente que é feita de sonhos, me disse Maria, olhando para o céu estrelado, que cobria aquela ilha dourada. – Tem gente que é feita de sonhos, repetiu!

 

Ri de suas palavras, mas sabia que ela estava certa, eu mesma era feita de sonhos e, ainda que a vida insistisse em me pregar peças como aquela, eu e ela conseguíamos sorrir.

  De onde a conhecia? Como sabia tanto sobre ela? Tudo para mim, naquela noite, tinha a face do mistério.

 Vivendo aquele dilema, eu sorri um sorriso desassossegado, enquanto Maria  me olhava e dizia que tudo iria se resolver logo, era só esperar.

 

Por falar em esperar, Maria também era a imagem da esperança, além de ser feita de sonhos, trazia a cor verde da esperança no olhar e as delícias do sonhador na alma de menina.

 Por que estou sendo colocada à prova deste encontro desencontrado, hein? Maria lançava para mim seu sorriso manso e este encontrava o meu olhar em desassossego, enquanto suas pernas se balançavam ao vento. Sentadas no cais, com a brisa a embalar aquele momento, sorríamos para a lua, que se espreguiçava bem devagar, enquanto saia detrás de um nuvem bem gorda.

 Maria não respondeu à minha pergunta, apenas cantarolou uma canção de menina e, neste instante, redonda, aberta e bem clara, a lua surgiu para alegrar minha alma deserta.

 Maria aproveitou aquele parto feito no céu, para falar comigo sobre as flores do jasmineiro, plantado na porta da pousada, onde eu estava hospedada.  O jasmineiro resolveu que iria recostar-se no muro de pedras, tinha toda a liberdade do mundo, mas quis agarrar-se às pedras duras daquele muro, por quê será? Perguntou-me a menina.

 Com a face banhada pela luz do luar e por sua própria luz, foi Maria quem respondeu à pergunta que ela mesma fizera. Maria falou com doçura: – Sabe o que eu acho, o jasmineiro pretende proteger suas flores, você já viu como o vento aqui é forte?

 – Maria, você está certa, quantas vezes nos agarramos a “muros de pedras”, para afastar a solidão, quantas vezes ficamos esperando que um milagre aconteça para que neste reencontro entre a flor e a pedra, o mistério da vida faça germinar algo de novo?

 Neste instante, uma voz antiga chamou meu nome. Voltei-me e vi, à luz do luar, uma imagem do passado que viera me consolar.

Maria, mais uma vez sorriu para mim, transformou-se em um lindo pássaro azul e saiu pelo mundo a voar.

 Mistérios!

 

(Do livro Mistérios e Saudades, de Sônia Moura)

 

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