(Autoria: SÔNIA MOURA)
Quando te vi com outra,
O meu silêncio,
Navegando na contra-mão da história,
Ampliou em mil meus sentimentos,
Embaralhando palavras em minha memória.
Magoada, recolhi-me, então,
Dentro de uma concha,
Que se fechou por inteiro.
Ferida, não produzi pérolas,
Só fiz brotar um enorme espinheiro.
Triste, passei de borboleta à lagarta,
Voltei ao casulo e não pude mais voar.
Perdida, qual um navio à deriva,
Ancorei na terra, não no mar.
Ferida, fiz-me pássaro acuado
Largado num canto qualquer,
Com sangue a colorir a plumagem
Tentei cantar, não consegui uma nota sequer.
Esta era a minha imagem?
Procurei meu corpo, não encontrei,
Procurei minh’alma, também não,
Num espelho espatifado,
Onde o côncavo tomava o lugar do convexo
Vi um rosto mal formado
Meu olhar perplexo, me perguntava:
Onde me encontrar então?
No ontem, no amanhã ?
Nos escombros dos desertos?
Uma voz mansa sussurrou aos meus ouvidos:
Você está nestes versos, inversos.
(Do livro POEMAS EM TRÂNSITO de SÔNIA MOURA)