Os vendedores já a conheciam. Mais uma vez, comprou um livro no sebo, gostava disso. Livros antigos, já manuseados por outros. O que teriam achado da história? Leram por prazer ou por obrigação? Comprava, lia e passava adiante. Dizia sempre que livro foi feito para trocar de dono e que o autor, após o livro editado, perdeu a primazia da autoria, passara a ser coautor.
Além das histórias narradas, também se encantava com o que encontrava nos livros usados. Uns escreviam lindas declarações de afeto, outros, apenas colocavam seus nomes e, se fossem estudantes, assim ela deduzira, o nome tinha que estar completo, às vezes, com o nome do colégio e da turma.
Já encontrara dentro de livros alguns tesouros, formados por palavras observadoras, que acrescentavam o que o leitor, agora também coautor, pensava. Encontrara flâmulas, flores secas, folhas, penas, fotos, mas só uma chamou-lhe a atenção, e foi sobre ela que a compradora me falou.
Aquela imagem encantou a leitora, e as palavras foram caindo de sua boca, lentamente, como se fossem contas de um colar que se partira.
Era uma foto cortada e nela se via o rosto sorridente de uma bela jovem, a felicidade fora capturada. Embora houvesse sido cortada, ainda dava para ver que a foto era de um casal, pois ainda se via parte de uma cabeça masculina, encostada na cabeça, cujos lábios sorridentes encantaram a leitora.
Quem seriam eles, o que os separou, como mostrava a foto mutilada? A leitora jamais terá respostas a estas perguntas, mas, uma coisa é certa, quando as dimensões do amor se rompem, o amor acaba. Então não há palavras que traduzam o sofrimento do desamor, o passado enevoado se torna invisível, e, até mesmo um retrato se torna divisível, sem que nada mais reste, além da dor.