De Olho no Horóscopo

DE OLHO NO HORÓSCOPO
(Conto de Fevereiro do livro DOZE MULHERES CONTAM, de SÔNIA MOURA)

O bar fervilhava. Era Sexta-feira. Num canto, uma silhueta se destacava por estar tão escondida. Ele a observava.
Seus olhos levantaram –se, arrastaram –se pelo bar e encontraram os dele.
Qual será o signo dele? Era simpático, bonito. Sorriu.
Com jeitinho ele foi-se aproximando, gostara realmente daquela garota. Apresentou –se.
– Paulo Romero, boa noite.
– Raquel.
– Bonito nome.
– Obrigada.
– Posso? Vamos dançar?
– Sorriu. Acompanhou-o.
Qual será o signo dele? Como é que vou perguntar?

Descobriu logo que ele gostava da cor verde, preferencialmente verde claro ou verde- água e adorava o mar, aliás o mar era a sua paixão. Gostava de pesca, respeitava o mar. Devia ser de peixes.
Sabia tudo sobre os signos, sabia tudo sobre horóscopo.
Peixes combina com Câncer e com Escorpião, melhor ainda se for do primeiro decanato.
– Bonita esta música.
– É. Chega a comover.
– Concordo que a música é muito bonita, mas eu não meu comovo com tanta facilidade. Riu e piscou pra ela.
– Não, ele não pode ser de peixes. Pisciano é sensível, sonhador. Não, ele não é de peixes.
Franziu o cenho, expulsou o sorriso.
– Vamos parar?
– Por quê?
Nada falaram por uns minutos. Ela sabia que devia insistir. Ele achava que ela era de peixes.
– É de peixes, só pode ser. Procuro alguém assim, com esse olhar manso.
– Pois é.. (ambos falaram ao mesmo tempo).
– Ouça esta música, esta sim, é bonita mesmo, não acha? Adoro música romântica.
– Eu também.
Marcaram um encontro para o dia seguinte.
– Este telefone que não toca. Hesita. Não, vou ligar mais tarde.
– Estou tão confusa. E se ele não for de peixes? Preciso encontrar alguém de peixes.
O olhar dela…, ela é de peixes, mas algo não combina, não sei bem o que é.
– Alô ?!
– Oi, é Paulo Romero.
– Oi, tudo bem?
– O nosso encontro está de pé?
– Claro.
– Então, te pego às oito em ponto.
Saíram para um lugar tranqüilo. Era fim de setembro, o clima na cidade era ameno. Foram a um barzinho em frente ao mar.
Ele era gentil, mas, às vezes, parecia tão seco, tão sem sentimento. Não podia ser de peixes. Ela pareceu-lhe um pouco arrogante, uma altivez desmedida. Não podia ser de peixes, mas aquele olhar manso e aquele sorriso… Preciso encontrar alguém de peixes.
– Água – de – coco?
– Hum, hum. Adoro. Eu também.
Beberam água –de – coco, enquanto a lua namorava o mar. Olhos nos olhos. Que olhos e que olhar, brilhava mais ainda com a luz do luar.
As mãos dele – que lindas – tão másculas e, ao mesmo tempo tão suaves. Ele podia ser de peixes.
Falaram sobre tantas coisas, pois no início se tem muito assunto pra falar. Veio o primeiro beijo.
– Meu Deus, como beija bem.
– Boa noite, te ligo, tchau.
Durante dias se encontraram com freqüência, se olharam, se falaram. Ambos mostraram certa timidez. Mas os beijos…Quem conseguiria dormir depois daqueles beijos, daqueles abraços, antes era preciso sonhar. Impossível deixar de pensar, impossível. Ela tem que ser de Peixes. Ele tem que ser de Peixes. Ela é carinhosa. Ele é carinhoso. Só pode ser de Peixes.
– Raquel? Bom dia, querida.
– Bom dia, amor.
Leram que iriam encontrar alguém de Peixes. A cartomante dissera a ela que seria alguém nascido em fevereiro, depois do dia vinte, dissera também que o beijo iria confirmar isto. Seria um beijo infinitamente melhor que todos os outros. Era ela. Era ele. Não havia nenhuma dúvida, ele era de peixes, ela era de peixes.
– Trouxe esta lembrancinha pra você.
– Querido, é lindo, lindo mesmo.
– Gostou? É um peixinho para combinar com o signo, deixe- me colocá – lo no seu cordão.
Ela, embevecida, nem percebeu o que ele falara.
– Que coincidência, trouxe pra você.
– Muito bonita esta carteira e este peixinho gravado, muito legal. É xilogravura?
– É, mandei gravar para combinar com o seu signo.
Ele também não ouviu.
– Amor, quase que você acertou e antecipou meu presente, meu aniversário é na quarta- feira que vem.
– Quarta, próxima? O meu também, l4 de outubro.
Não eram do signo de Peixes, mas estavam fisgados e nem perceberam isto.
Beijaram-se longa e calorosamente, um calor imenso tomou conta deles e de tudo mais. Seus corpos ardiam, estavam em brasa. Não resistiram, foram para um motel. Amor louco, daqueles em que se começa a tirar a roupa na garagem.
– Ela só pode ser de Peixes, eu li, eu li.
– Ele só pode ser de peixes, o beijo, a cartomante falou.
Amaram-se até a exaustão. Adormeceram um no braço do outro. Sonharam o mesmo sonho.
Acordaram com um fiapo de sol sobre o lençol. Beijaram-se, tomaram café. Resolveram passar o dia ali.
Ligaram e avisaram às famílias que estava tudo bem e que iriam demorar. Foram à janela saborear o dia, o maravilhoso dia. Raquel brincava orgulhosa com o peixinho preso na corrente.
– São um encanto, os meus dois peixinhos…
– Nosso aniversário é na próxima quarta e já estamos comemorando e muito bem. Riram o riso dos amantes. Pela primeira vez se deram conta de que eram de Libra. Então, deixaram estabelecido que a partir daquele momento mudariam o horóscopo, ambos são do signo de Peixes. Só podiam ser de Peixes. Raquel sempre soube disto.

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