24/09
Foi na noite de natal
Que esperei papai Noel
Esperei minha boneca
Esperei minha alegria
Fiquei sozinha outra vez
Consolou-me a poesia
(Da obra Poesia Dia a Dia)
24/09
Foi na noite de natal
Que esperei papai Noel
Esperei minha boneca
Esperei minha alegria
Fiquei sozinha outra vez
Consolou-me a poesia
(Da obra Poesia Dia a Dia)
ACALANTO
Sossega teu sonho em meu regaço
Que ainda há tempo para o amor
– É tarde, dizes assim
Meio sonolento,
Peito cheio de dor,
Alma ao relento…
Deixa nascer em ti
Um novo rebento
Acorda teu dia
Enrosca tua esperança
E teu cansaço
Em minha alma ardente
Esquece o mundo lá fora
Ele mente…
O amor e os amantes
Não são almas carentes
Volta a sonhar
Pendura teu desânimo
Nas asas do vento
Deixa renascer tua alma
O mundo é voraz
Mas a vida pede calma
Ama, nada mais terno
Para revigorar a esperança
Vive que viver em amor
Não cansa
Travaram meus sentimentos
Trancaram o meu coração
Tiraram o meu passe livre
Trocaram meu sim por não
Meus dias vivem em trevas
Machucaram a minha paixão
Mandaram meu sonho embora
Mudaram meu sim pra não
Escrevendo estas trovas
Acalmo a desilusão
Retirei travas da alma
Entendi o sim e o não
(Da obra: COISAS DE ADÃO E EVA, de Sônia Moura)
AMOR PELA JANELA [Sônia Moura]
Sem tirar os olhos dela
Ele na janela vivia
Dia e noite
Noite e dia
Sem tirar os olhos dele
Ela de lá não saía
Dia e noite
Noite e dia
A lua pelo céu corria
O sol no céu luzia
Dia e noite
Noite e dia
A paixão tem seus mistérios…
Mas o que ninguém sabia
É que o boneco – soldado
E a boneca – bailarina
Mesmo presos na janela
Dia e noite
Noite e dia
Se amavam a distância
Dia e noite
Noite e dia
Que a paixão tem seus mistérios
Disto os dois já sabiam
DITIRAMBO (por Sônia Moura)
Esse canto é pra você, amigo Baco,
Pois você é dos meus,
Menino do balacobaco!
Alguns querem lhe condenar
Mas não sabem do seu passado
Sua família era de amargar,
Era tanta confusão
Que nas coxas do papai Zeus,
Você foi parar
E lá, acabou de se criar
Mesmo assim seguiu em frente
Rindo do falatório das gentes
Muito vinho, muito riso
Mas nada de muito siso
Na Grécia foi Dionísio
E teve outros nomes mais
Sua vida era um folguedo
Coisa séria era brinquedo,
Transas a todo vapor
Com alma de menino viril
Ás vezes, uma menina gentil
Ainda assim
Dizem que você, amigo Baco,
Não tinha nada de fraco
Era espada, era demais!
Festas, danças, bebedeiras
Eram muitas bacanais
Nas Dionísias urbanas
Fossem gregas ou romanas
Eram flautas a soar,
Dançarinas de se admirar
Com máscaras a coreografar
A alegria era certa
A orgia era um fato
Dizem, amigo Baco,
Que daí nasceu o teatro
Agora, falando sério,
Sério?
Baco está a gargalhar…
Levar a vida na boa
Deixar de sofrer à toa
Viver a vida de fato
Com alegria e sem recato
Baco, querido Baco,
Não é mesmo o seu retrato?
(Da obra: Coisas de Adão e Eva, de Sonia Moura)
À MINHA TERRA, AO MEU LAR
Tu ouviste, ó Rio de Janeiro,
O meu primeiro chorar
Despontando para o teu sol
Para o teu sal
Para o teu mar
Temperada com o dendê de um pai baiano
E como sobremesa,
um bom doce de uma mãe mineira
No mês do carnaval
Cheguei ao teu colo, meu Rio de Janeiro,
Não podia ser em outro lugar
Se ontem ouviste o meu chorar
Hoje o meu riso é todo teu
E também o meu cantar
Bocas (Sônia Moura)
Qualquer beijo é bom (menos o beijo falso), mas beijo bom mesmo é o beijo na boca, esse é uma delícia. Se você tem uma boca para beijar, preste atenção:
Para evitar ser pego com a boca na botija e espantar o olho gordo que queira atrapalhar as delícias desse beijo, o melhor é fazer boca de siri ou, então, só comentar à boca pequena, senão o assunto se espalha de boca em boca.
Prepare-se, sempre vai ter alguém falando à meia boca: -Gostaria de poder beijar assim, então, cala-te boca, nada de botar a boca no mundo, porque, tenha a certeza, se a notícia se espalhar, vai ter um mundo gente de boca aberta e um outro tanto com água na boca.
Portanto, nada de botar a boca no trombone, nada de alardear aos quatro ventos, não banque o boca grande, melhor se resguardar para não cair na boca do povo.
Dirão alguns: – Com certeza, ela caiu na boca do lobo, não ligue, vista a sua calça boca de sino (voltou à moda, sabia?) e não pare na boca do túnel, pois o fantástico é atravessá-lo, nada de ficar indecisa arriscando-se a entrar em um tremendo bate boca, você sabe, há muito boca suja por aí, então para que discutir?
Pense só nos beijos, pense na língua roçando os lábios, acariciando o céu da boca, torne-se criança e brinque de “bento que bento é o frade, frade, na boca do forno, forno, tirai um bolo, bolo, tudo o que seu mestre mandar, faremos tudo.” Então, o senhor mestre ordena: – vá conhecer o país das quimeras, não sabe onde é? Pergunte, pois quem tem boca vai a Roma, e se chegar lá na boca da noite, entregue-se às maravilhas de amar e, de novo, aproveite, porque beijo bom mesmo é o beijo na boca.
[Da obra: Coisas de Adão e Eva, de Sônia Moura]
ORAÇÃO ÀS AVESSAS (por SÔNIA MOURA)
Palavras pesam
E podem ferir um coração
Não quero te deixar
E nem quero ficar
Eis o mistério de amar
De dentro do baú empoeirado
Saem palavras sangradas
Rolam correntes macabras
Correm rios desesperados
Descem lágrimas em aluvião
E eu, perdida, atordoada,
Procuro meu rosto na escuridão
Quero deixar-te ou não?
Interromper nossa aventura
Esquecer as nossas juras
Impossível
Sei que eu juro deixar-te
E te desconjuro por esse gostar
Enquanto tu, cinicamente, juras me amar
Maldigo o dia que te conheci
Bendigo a hora de te encontrar
Regozijo-me dos beijos que te dei
Mas, de uma coisa eu acho que sei:
Tu não és digno
De estar em minha morada
E nem de ter-me como sua amada
Dessa masmorra fria
Na qual doidamente me encerrei
Olho-te através das grades
Dessa prisão horrenda
Não porque me prendas
Prendo-me, arrependo-me e exagero
Simplesmente, porque te quero!
(Da obra: Súbitas Presenças, de Sônia Moura)
(IR)REAL (Autoria: Sônia Moura)
Numa estrada deserta, encontrei um mascarado. Assustei-me, não por medo, assustei-me pelo deserto da estrada e pela incompatibilidade da data e da máscara. Era julho e não era carnaval.
Olhando-me por trás de sua máscara dourada como o sol do meio-dia, a voz saiu-lhe calma e doce como o sumo de uma romã madura a escorrer pela boca, a adoçar os lábios, a enternecer a língua.
– Aonde vais? Fica comigo.
Como estávamos só nós dois e o deserto da estrada, claro que o mascarado dirigia-se a mim e prontamente respondi:
– Vou em busca de todos os meus sonhos!
Imediatamente ele retrucou:
– Irás se arriscar em um porto qualquer? Os portos dos sonhos são tão nebulosos ou seriam diáfanos?
– Não sei, disse eu, mas quero ir para o paraíso, é lá que vivem meus sonhos.
– Ah! por que ir para tão longe e me deixar aqui, sozinho a contigo sonhar…
– Quem é você?
– Sou o teu sonho, sou tua estrela, teu amor…
– Tira a máscara, por favor, por favor!
Ele começou a cantar uma canção que falava de beijos trocados num quarto de motel, de luzes e espelhos a multiplicar o par de amantes, das juras de amor a nos segurar, do sexo e dos abraços que burlavam qualquer forma de desencanto.
Terminada a canção, ele me falou:
– É por isto que eu canto.
– Quem é você, de onde vem este seu encanto?
– Dos teus sonhos, ele disse.
– Dos meus sonhos? Mas estou indo ao encontro deles.
– Para quê, se podes embarcar no navio dos sonhos, agora? Disse o mascarado, deixando o sorriso ultrapassar a máscara.
– Que navio? Não estamos no mar.
Mais uma vez, o sorriso pulou daquele rosto oculto, fazendo que pensasse ter visto um rosto sem máscara.
– Sabes que eu te amo muito, muito, muito. Por que não acreditas em mim?
Aturdida e perdida no meio da estrada deserta, no meio do sonho deserto, pela primeira vez, vejo flores ladeando a estrada, flores amarelas, como a máscara e como o sol. Só o sorriso que saltava da máscara era cor da prata, brilhava mais que a luz daquele olhar suplicante.
– Meu Deus, quem é este homem? Por que de mim se esconde? Pensei.
– Tenho tanta saudade de ti, Pequenina.
– Oh! Deus, será que é você, aquele a quem procuro a tanto tempo…
– Podes vir, meu anjo, eu sempre serei teu, só teu, de mais ninguém. Naveguei por tantos mares, conheci portos e muitas mulheres, mas nunca te esqueci. Finalmente te encontro no meio deste nada, logo você que para mim é tudo…
Uma chuva fina começou a molhar nossos rostos, nossos corpos e nossos sonhos. Agora eram a flores que sorriam.
A chuva aumentou, a máscara foi-se diluindo, diluindo e aquele rosto antigo foi-se mostrando lentamente a mim, como uma flor a desabrochar no meio do deserto.
Vi aquele rosto tão saudoso, entreguei-me a seus abraços, esqueci-me da vida e só aí percebi que eu estava a sonhar…
Mas consolei-me porque mesmo sendo apenas um sonho, algo irreal, a súbita presença daquele mascarado, agora tão real para mim, deu-me a certeza de que, em toda a minha vida, nunca mais iria sentir um amor tão real.
(Do livro: Súbitas Presenças de SÔNIA MOURA)