DISCO DE VINIL

 disco de vinil

DISCO DE VINIL (Autoria: Sônia Moura)

Conhecia Fátima e Ivo há muito tempo, morávamos no mesmo bairro desde os doze anos, isto já faz tanto tempo…
O tempo voou e, quando demos por nós, já estávamos de casamento marcado, eu com Marinete e Ivo com Juliana. Veio o casamento de Ivo (o Magrela), meses depois o de Ricardo (o Magrão), o de Cristóvão (o Navegador), de Soraia (como suspiramos pelos cantos por Soraia!), de Cecília, de Andréia e, finalmente, o meu. A vida caminhava…
Eu e Ivo fomos os únicos a não sair do bairro, do nosso velho bairro. Acabamos compadres. Eu amava Marinete, o tempo fortalecia nossa amizade e, por tabela, nosso amor, Marinete tem um sexto sentido muito apurado, aliás dizem que as mulheres são assim mesmo, mas ela era demais, não costumava errar.
Seria sexto sentido, inteligência ou observação?, meu pai sempre disse que era tudo junto; adorava a nora que o tratava como um pai, um irmão e ultimamente como um filho.
Gostávamos de conversar na cama, no nosso ninho, como dizia Marinete, às vezes, esquecíamos da hora, outras vezes, o desejo falava mais alto e a conversa dava lugar ao sexo gostoso.
Numa destas noites o sexo veio primeiro e depois vieram outras palavras. Abracei Marinete e o papo correu tão gostoso como o sexo.
Falamos sobre nós mesmos, Marinete perguntou-me se eu me lembrava do disco de vinil que eu lhe dera num dia dos namorados. Claro que sim, eu disse. E continuei, mas este disco já era, ainda bem que eu continuo aqui. Marinete levantou-se, foi até o armário, voltou com uma caixa preta, amarrada com uma grossa fita amarela e me entregou.
Abri com mãos ávidas e olhos curiosos, e lá estavam bilhetes, cartas, recados, cartões, entrada de cinema, papéis amarelados pelo tempo.
Um perfume suave se espalhou pelo quarto, Marinete colocava sachês dentro de caixas e gavetas.
Um frescor de saudade e de lembranças se apoderou de mim, e comecei a remexer papéis, fitinhas, envelopes, lembranças, e, lá no fundo, estava um pedaço do disco de vinil.
Era o disco de que ela tanto gostava, mas que, num momento de arroubo juvenil, espatifara-o por ciúmes da minha namorada de infância. Minha mulher jurava que eu ainda pensava em Andréia.
Ali estavam marcas do nosso amor, tudo era importante, mas o pedaço do disco de vinil era uma prova de que o sexto sentido feminino é forte mesmo.
Marinete tinha razão.

(Do livro: Súbitas Presenças de Sônia Moura)

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2 comentários sobre “DISCO DE VINIL

  1. Elisabete Pessoa disse:

    A maga das letras, a alquimista das palavras. Adoro o que você escreve ,não tive tempo de ler todos os escritos, porém dentre os que li, chamou-me a atenção “Balanço Geral” Lindo e acho que representa um pouco do seu momento.BJs. Bete

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